"O Superior Tribunal de Justiça tirou um enorme peso das costas do Google, ao decidir que a empresa americana não pode ser responsabilizada por conteúdo publicado por internautas no Orkut. A decisão foi fruto de um pedido de indenização de uma mulher, aceito em primeira instância, mas indeferido pelo STJ. O tribunal, no entanto, confirmou a determinação de que todo o material ofensivo seja excluído."
A teoria da responsabilidade civil hoje aplicada às relações de consumo é a teoria do risco criado (art. 14 do Código de Defesa do Consumidor), que pode ser entendida como "aquele que, em razão de sua atividade ou profissão, cria um perigo, está sujeito à reparação do dano que causar, salvo prova de haver adotado todas as medidas idôneas a evitá-lo" - Caio Mário.
O fato de o STJ ter entendido, no entanto, "que as obrigações do Google se restringem a disponibilizar na rede as informações e garantir o sigilo e segurança dos dados dos usuários" é muito ruim, pois ignora o dever do fornecedor de serviços de buscar métodos idôneos para prevenir danos a terceiros, como a proliferação de perfis anônimos ou fakes.
A Constituição, inclusive, é clara sobre a liberdade de manifestação do pensamento: "é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato" (art. 5º, IV). Ou seja, as pessoas devem ser livres para dizerem o que pensam, mas não podem fazê-lo de forma anônima e os fakes são nada menos que uma forma de anonimato.
A alegação de que a fiscalização prévia, por outro lado, não seria uma dessas obrigações, "eliminaria um dos maiores atrativos da internet, que é a transmissão de dados em tempo real" e acabaria com o seu dinamismo é muito perigosa, pois pode conceder uma carta branca aos fornecedores desses serviços para não fiscalizarem a autencidade dos perfis das suas redes sociais.
Não se defende aqui a teoria do risco integral, uma exacerbação da teoria do risco criado, que terminaria por responsabilizar as redes sociais solidariamente por quaisquer danos decorrentes das relações interpessoais advindos do seu negócio.
Problemático é quando o fornecedor não realiza o controle devido da idoneidade dos dados cadastrais da sua rede, impedindo que as vítimas de ataques pessoais busquem a reparação judicial do dano sofrido, por não saberem precisar a identidade do autor do ato ilícito e, por consequência, o polo passivo da demanda.
Ao definir que a única obrigação do Google é disponibilizar nas redes as informações, fornecer segurança e sigilo, e que ao fazer o controle preventivo dos dados acabaria com o seu dinamismo, o STJ abre temerário precedente para a promoção de grave descontrole e injustiça. Não é necessário controle preventivo dos dados, mas da sua fonte emissora e rapidez na remoção dos conteúdos ilícitos, sob pena de, agora sim, concorrer solidariamente para o dano, ainda que originário de fontes não-anônimas.
A concepção atual é a de que nas relações jurídicas travadas, em sede de responsabilidade civil, deve ser a vítima, e não o autor do ato ilícito, o centro das preocupações do Direito. Portanto, se alguém, servindo-se de perfil anônimo, postar algo no Orkut que venha a causar danos à honra de outrem, em não sendo possível identificar o ofensor, não é admissível que a vítima tenha de suportar o prejuízo.
A função do Direito é buscar a justiça e, em assim sendo, se não se pode apontar um responsável direto e imediato pelo dano, o mais justo que se espera é a solidarização da responsabilidade pelos membros da comunidade, incluindo o Google que participa da comunidade como fornecedor.
Imaginemos se todos criássemos um perfil anônimo, de modo que não pudéssemos ser rastreados, e realizássemos ataques à honra uns dos outros. Como ficaria a proteção jurídica das vítimas diante da injusta agressão sofrida? Nesse sentido é que a doutrina moderna vem trabalhando com a concepção de causalidade alternativa. Nessa esteira, leciona Sergio Cavalieri Filho, a saber:
A meu ver, é indubitável o vínculo comunitário, onde o Google participa na qualidade de fornecedor do serviço, incumbindo a todos solidariamente a responsabilizadade, não lhes sendo negado o direito de regresso, juntamente com o encargo da apuração da identidade por trás do perfil do ofensor.
1. CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de Responsabilidade Civil, 9ª ed. São Paulo: Atlas, 2010, pp. 62-63.
A teoria da responsabilidade civil hoje aplicada às relações de consumo é a teoria do risco criado (art. 14 do Código de Defesa do Consumidor), que pode ser entendida como "aquele que, em razão de sua atividade ou profissão, cria um perigo, está sujeito à reparação do dano que causar, salvo prova de haver adotado todas as medidas idôneas a evitá-lo" - Caio Mário.
O fato de o STJ ter entendido, no entanto, "que as obrigações do Google se restringem a disponibilizar na rede as informações e garantir o sigilo e segurança dos dados dos usuários" é muito ruim, pois ignora o dever do fornecedor de serviços de buscar métodos idôneos para prevenir danos a terceiros, como a proliferação de perfis anônimos ou fakes.
A Constituição, inclusive, é clara sobre a liberdade de manifestação do pensamento: "é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato" (art. 5º, IV). Ou seja, as pessoas devem ser livres para dizerem o que pensam, mas não podem fazê-lo de forma anônima e os fakes são nada menos que uma forma de anonimato.
A alegação de que a fiscalização prévia, por outro lado, não seria uma dessas obrigações, "eliminaria um dos maiores atrativos da internet, que é a transmissão de dados em tempo real" e acabaria com o seu dinamismo é muito perigosa, pois pode conceder uma carta branca aos fornecedores desses serviços para não fiscalizarem a autencidade dos perfis das suas redes sociais.
Não se defende aqui a teoria do risco integral, uma exacerbação da teoria do risco criado, que terminaria por responsabilizar as redes sociais solidariamente por quaisquer danos decorrentes das relações interpessoais advindos do seu negócio.
Problemático é quando o fornecedor não realiza o controle devido da idoneidade dos dados cadastrais da sua rede, impedindo que as vítimas de ataques pessoais busquem a reparação judicial do dano sofrido, por não saberem precisar a identidade do autor do ato ilícito e, por consequência, o polo passivo da demanda.
Ao definir que a única obrigação do Google é disponibilizar nas redes as informações, fornecer segurança e sigilo, e que ao fazer o controle preventivo dos dados acabaria com o seu dinamismo, o STJ abre temerário precedente para a promoção de grave descontrole e injustiça. Não é necessário controle preventivo dos dados, mas da sua fonte emissora e rapidez na remoção dos conteúdos ilícitos, sob pena de, agora sim, concorrer solidariamente para o dano, ainda que originário de fontes não-anônimas.
A concepção atual é a de que nas relações jurídicas travadas, em sede de responsabilidade civil, deve ser a vítima, e não o autor do ato ilícito, o centro das preocupações do Direito. Portanto, se alguém, servindo-se de perfil anônimo, postar algo no Orkut que venha a causar danos à honra de outrem, em não sendo possível identificar o ofensor, não é admissível que a vítima tenha de suportar o prejuízo.
A função do Direito é buscar a justiça e, em assim sendo, se não se pode apontar um responsável direto e imediato pelo dano, o mais justo que se espera é a solidarização da responsabilidade pelos membros da comunidade, incluindo o Google que participa da comunidade como fornecedor.
Imaginemos se todos criássemos um perfil anônimo, de modo que não pudéssemos ser rastreados, e realizássemos ataques à honra uns dos outros. Como ficaria a proteção jurídica das vítimas diante da injusta agressão sofrida? Nesse sentido é que a doutrina moderna vem trabalhando com a concepção de causalidade alternativa. Nessa esteira, leciona Sergio Cavalieri Filho, a saber:
Há quem se oponha veementemente à responsabilização do grupo sem que exista prova de participação de todos os seus integrantes. Mas, na sociedade moderna, em face da massificação das relações sociais, empresariais e profissionais, e dos riscos sociais cada vez maiores, não será justo, nem razoável, deixar a vítima sem a correspondente indenização por não ter sido possível apurar quem, no grupo, deu causa direta e imediata ao evento. Evidenciado o vínculo comunitário entre os membros do grupo, todos os possíveis autores devem ser considerados responsáveis solidariamente, face à ofensa perpetrada à vítima por um ou mais deles.¹Em seguida, o jurista colaciona uma jurisprudência da 4ª Turma do STJ (REsp 64.682/RJ) que condenou todos os moradores do prédio a indenizarem a vítima de um objeto lançado de uma de suas janelas.
A meu ver, é indubitável o vínculo comunitário, onde o Google participa na qualidade de fornecedor do serviço, incumbindo a todos solidariamente a responsabilizadade, não lhes sendo negado o direito de regresso, juntamente com o encargo da apuração da identidade por trás do perfil do ofensor.
1. CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de Responsabilidade Civil, 9ª ed. São Paulo: Atlas, 2010, pp. 62-63.
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